Anteprojeto de Lei Municipal e minuta de
justificativa
Ementa:
Institui, no âmbito do sistema municipal de ensino, o "Programa Escola sem
Partido"
Art. 1º. Fica criado, no âmbito do sistema
municipal de ensino, o "Programa Escola sem Partido", atendidos os
seguintes princípios:
I - Neutralidade política, ideológica e religiosa
do Estado;
II - Pluralismo de ideias no ambiente acadêmico;
III – Liberdade de consciência e de crença;
IV - Reconhecimento da vulnerabilidade do educando
como parte mais fraca na relação de aprendizado;
V - Educação e informação do estudante quanto aos
direitos compreendidos em sua liberdade de consciência e de crença;
VI - direito dos pais a que seus filhos recebam a
educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções.
Art. 2º. São vedadas, em sala de aula, a
prática de doutrinação política e ideológica bem como a veiculação de conteúdos
ou a realização de atividades que possam estar em conflito com as convicções
religiosas ou morais dos pais ou responsáveis pelos estudantes.
§ 1º. As escolas confessionais e as
particulares cujas práticas educativas sejam orientadas por concepções,
princípios e valores morais, religiosos ou ideológicos, deverão obter dos pais
ou responsáveis pelos estudantes, no ato da matrícula, autorização expressa
para a veiculação de conteúdos identificados com os referidos princípios,
valores e concepções.
§ 2º. Para os fins do disposto no § 1º deste
artigo, as escolas deverão apresentar e entregar aos pais ou responsáveis pelos
estudantes material informativo que possibilite o conhecimento dos temas
ministrados e dos enfoques adotados.
Art. 3º. No exercício de suas funções, o professor:
I - Não se aproveitará da audiência cativa dos
alunos, com o objetivo de cooptá-los para esta ou aquela corrente política,
ideológica ou partidária;
II - não favorecerá nem prejudicará os alunos em
razão de suas convicções políticas, ideológicas, morais ou religiosas, ou da
falta delas;
III - não fará propaganda político-partidária em
sala de aula nem incitará seus alunos a participar de manifestações, atos
públicos e passeatas;
IV - ao tratar de questões políticas, socioculturais
e econômicas, apresentará aos alunos, de forma justa, as principais versões,
teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito;
V - respeitará o direito dos pais a que seus filhos
recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções;
VI - não permitirá que os direitos assegurados nos
itens anteriores sejam violados pela ação de terceiros, dentro da sala de aula.
Art. 4º. Os alunos matriculados no
ensino fundamental e no ensino médio serão informados e educados sobre os
direitos que decorrem da liberdade de consciência e de crença assegurada pela
Constituição Federal, especialmente sobre o disposto no art. 3º desta Lei.
§ 1º Para o fim do disposto no caput
deste artigo, as escolas afixarão nas salas de aula, nas salas dos professores
e em locais onde possam ser lidos por estudantes e professores, cartazes com o
conteúdo previsto no Anexo desta Lei, com, no mínimo, 70 centímetros de altura
por 50 centímetros de largura, e fonte com tamanho compatível com as dimensões
adotadas.
§ 2º. Nas instituições de educação infantil, os
cartazes referidos no parágrafo 1º deste artigo serão afixados somente nas
salas dos professores.
Art. 5º. Professores, estudantes e pais
ou responsáveis serão informados e educados sobre os limites éticos e jurídicos
da atividade docente, especialmente no que tange aos princípios referidos no
art. 1º desta Lei.
Art. 6º. A Secretaria Municipal de Educação contará
com canal de comunicação destinado ao recebimento de reclamações relacionadas
ao descumprimento desta Lei, assegurado o anonimato.
Parágrafo único. As reclamações referidas no caput
deste artigo deverão ser encaminhadas ao órgão do Ministério Público incumbido
da defesa dos interesses da criança e do adolescente, sob pena de
responsabilidade.
Art. 7º. O disposto nesta Lei aplica-se, no que
couber:
I - aos livros didáticos e paradidáticos;
II - às avaliações para o ingresso no ensino
superior;
III - às provas de concurso para ingresso na
carreira docente;
IV - às instituições de ensino superior, respeitado
o disposto no art. 207 da Constituição Federal.
Art. 8º. Esta Lei entrará em vigor na data de
sua publicação.
ANEXO
DEVERES DO PROFESSOR
I - O Professor não se
aproveitará da audiência cativa dos alunos, com o objetivo de cooptá-los para
esta ou aquela corrente política, ideológica ou partidária.
II - O Professor não favorecerá nem
prejudicará os alunos em razão de suas convicções políticas, ideológicas,
morais ou religiosas, ou da falta delas.
III - O Professor não fará propaganda
político-partidária em sala de aula nem incitará seus alunos a participar de
manifestações, atos públicos e passeatas.
IV - Ao tratar de questões políticas,
sócio-culturais e econômicas, o professor apresentará aos alunos, de forma justa
– isto é, com a mesma profundidade e seriedade –, as principais versões,
teorias, opiniões e perspectivas concorrentes a respeito.
V - O Professor respeitará o direito dos
pais a que seus filhos recebam a educação moral que esteja de acordo com suas
próprias convicções.
VI - O Professor não permitirá que
os direitos assegurados nos itens anteriores sejam violados pela ação de
terceiros, dentro da sala de aula.
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JUSTIFICATIVA
É fato notório que professores e autores de livros
didáticos vêm-se utilizando de suas aulas e de suas obras para tentar obter a
adesão dos estudantes a determinadas correntes políticas e ideológicas; e para
fazer com que eles adotem padrões de julgamento e de conduta moral – especialmente
moral sexual – incompatíveis com os que lhes são ensinados por seus
pais ou responsáveis.
Diante dessa realidade – conhecida por
experiência direta de todos os que passaram pelo sistema de ensino nos últimos
20 ou 30 anos –, entendemos que é necessário e urgente adotar medidas
eficazes para prevenir a prática da doutrinação política e ideológica nas
escolas, e a usurpação do direito dos pais a que seus filhos recebam a educação
moral que esteja de acordo com suas próprias convicções.
Trata-se, afinal, de práticas ilícitas, violadoras
de direitos e liberdades fundamentais dos estudantes e de seus pais ou
responsáveis, como se passa a demonstrar:
1 - A liberdade de consciência – assegurada
pelo art. 5º, VI, da Constituição Federal – compreende o direito do
estudante a que o seu conhecimento da realidade não seja manipulado, para fins
políticos e ideológicos, pela ação dos seus professores;
2 - O caráter obrigatório do ensino não anula e não
restringe a liberdade de consciência do indivíduo. Por isso, o fato de o
estudante ser obrigado a assistir às aulas de um professor implica para esse
professor o dever de não utilizar sua disciplina como instrumento de cooptação
político-partidária ou ideológica;
3 - Ora, é evidente que a liberdade de consciência
dos estudantes restará violada se o professor puder se aproveitar de sua
audiência cativa para promover em sala de aula suas próprias concepções
políticas, ideológicas e morais;
4 - Liberdade de ensinar – assegurada
pelo art. 206, II, da Constituição Federal – não se confunde com liberdade
de expressão; não existe liberdade de expressão no exercício estrito da
atividade docente, sob pena de ser anulada a liberdade de consciência e de
crença dos estudantes, que formam, em sala de aula, uma audiência cativa;
5 - De forma análoga, não desfrutam os estudantes
de liberdade de escolha em relação às obras didáticas e paradidáticas cuja
leitura lhes é imposta por seus professores, o que justifica o disposto no art.
8º, I, do projeto de lei;
6 - Além disso, a doutrinação política e ideológica
em sala de aula compromete gravemente a liberdade política do estudante, na
medida em que visa a induzi-lo a fazer determinadas escolhas políticas e
ideológicas, que beneficiam, direta ou indiretamente as políticas, os
movimentos, as organizações, os governos, os partidos e os candidatos que
desfrutam da simpatia do professor;
7 - Sendo assim, não há dúvida de que os estudantes
que se encontram em tal situação estão sendo manipulados e explorados
politicamente, o que ofende o art. 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), segundo o qual “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer
forma de exploração”;
8 - Ao estigmatizar determinadas perspectivas
políticas e ideológicas, a doutrinação cria as condições para o bullying
político e ideológico que é praticado pelos próprios estudantes contra seus
colegas. Em certos ambientes, um aluno que assume publicamente uma militância
ou postura que não seja a da corrente dominante corre sério risco de ser
isolado, hostilizado e até agredido fisicamente pelos colegas. E isso se deve,
principalmente, ao ambiente de sectarismo criado pela doutrinação;
9 - A doutrinação infringe, também, o disposto no
art. 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que garante aos estudantes “o
direito de ser respeitado por seus educadores”. Com efeito, um professor que
deseja transformar seus alunos em réplicas ideológicas de si mesmo
evidentemente não os está respeitando;
10 - A prática da doutrinação política e ideológica
nas escolas configura, ademais, uma clara violação ao próprio regime
democrático, na medida em que ela instrumentaliza o sistema público de ensino
com o objetivo de desequilibrar o jogo político em favor de determinados
competidores;
11 - Por outro lado, é inegável que, como entidades
pertencentes à Administração Pública, as escolas públicas estão sujeitas ao
princípio constitucional da impessoalidade, e isto significa, nas palavras de
Celso Antonio Bandeira de Mello (Curso de Direito Administrativo, Malheiros,
15ª ed., p. 104), que “nem favoritismo nem perseguições são toleráveis.
Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou ideológicas não podem
interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de
facções ou grupos de qualquer espécie. ”;
12 - E não é só. O uso da máquina do Estado – que
compreende o sistema de ensino – para a difusão das concepções
políticas ou ideológicas de seus agentes é incompatível com o princípio da
neutralidade política e ideológica do Estado, com o princípio republicano, com
o princípio da isonomia (igualdade de todos perante a lei) e com o princípio do
pluralismo político e de ideias, todos previstos, explícita ou implicitamente,
na Constituição Federal;
13 - No que tange à educação moral, referida
no art. 2º, VII, do projeto de lei, a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, vigente no Brasil, estabelece em seu art. 12 que “os pais
têm direito a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja
de acordo com suas próprias convicções”;
14 - Ora, se cabe aos pais decidir o que seus filhos
devem aprender em matéria de moral, nem o governo, nem a escola, nem os
professores têm o direito de usar a sala de aula para tratar de conteúdos
morais que não tenham sido previamente aprovados pelos pais dos alunos;
15 - Finalmente, um Estado que se define como laico – e
que, portanto, deve ser neutro em relação a todas as religiões – não
pode usar o sistema de ensino para promover uma determinada moralidade, já que
a moral é em regra inseparável da religião;
16. Permitir que o governo de turno ou seus
agentes utilizem o sistema de ensino para promover uma determinada
moralidade é dar-lhes o direito de vilipendiar e destruir, indiretamente, a
crença religiosa dos estudantes, o que ofende os artigos 5º, VI, e 19, I, da
Constituição Federal.
Ante o exposto, entendemos que a melhor forma de
combater o abuso da liberdade de ensinar é informar os estudantes sobre o
direito que eles têm de não ser doutrinados por seus professores.
Nesse sentido, o projeto que ora se apresenta está
em perfeita sintonia com o art. 2º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, que prescreve, entre as finalidades da educação, o preparo do
educando para o exercício da cidadania. Afinal, o direito de ser informado
sobre os próprios direitos é uma questão de estrita cidadania.
Urge, portanto, informar os estudantes sobre o
direito que eles têm de não ser doutrinados por seus professores, a fim de que
eles mesmos possam exercer a defesa desse direito, já que, dentro das salas de
aula, ninguém mais poderá fazer isso por eles.
Note-se por fim, que o projeto não deixa de atender
à especificidade das instituições confessionais e particulares cujas práticas
educativas sejam orientadas por concepções, princípios e valores morais, às
quais reconhece expressamente o direito de veicular e promover os princípios,
valores e concepções que as definem, exigindo-se, apenas, a ciência e o
consentimento expressos por parte dos pais ou responsáveis pelos estudantes.